domingo, julho 05, 2009

Lobo em pele de ovelha "Cartas para Albert Nane"


Depois de um longo tempo de ausência, um papo sério. Meu amigo Jorge encontra-se numa situação difícil, por isso decidi publicar suas cartas, escritas no seu local de internamento. Esta é a primeira, endereçada a Albert Nane.


"Oi, Albert:
Não quero me fazer de vítima ou coitadinho. Eu aprontei muito... Mas tenho certeza que contribuí muito, também, para o cenário cultural e poético de Curitiba, seja formando novos escritores, seja polemizando, na produção de eventos, recitais, divulgando idéias, e principalmente a atitude de minha produção poética. Vale dizer que minha poesia tem mais verdades que minha própria existência!
Mas todo mundo tem seu lado negro... o meu sobressaiu devido a falta constante de dinheiro, incompreensão pública, instabilidade afetiva, e por conseqüência, causando minha instabilidade emocional e concomitantemente, o alcoolismo, que anestesia minha ansiedade, minha depressão e meu tédio.
Mas vamos aos fatos.
No ano passado, eu estava trabalhando como PSS da Secretaria de Educação do Estado. Estava com minha vida normalizada, mas essa Instituição não me pagou por três meses consecutivos em uma das escolas em que eu dava aulas. Contraí dívidas que posteriormente poderia liquidá-las, com a seqüência das aulas. Mas neste ano o PSS só me chamou em Maio... Imagina o tamanho da dívida e da degradação em que fui caindo. Para acumular, problemas afetivos, a humilhação de pedir dinheiro e não poder pagar... Estava sempre tenso, ansioso, deprimido, envergonhado, sem esperança e sem perspectiva...
Mandei meu livro para a Secretaria de Cultura, para ser publicado. Na primeira instância o livro foi aprovado. Na segunda, negaram a publicação. Isso porque essa Instituição não achou conveniente editar um livro com “palavras de baixo calão”.
Nas grandes editoras do Rio e São Paulo, mesmo meu livro tendo prefácios de pessoas com respeitabilidade poética e mercadológica, eu teria de pagar a edição, como é sabido. Não tenho dinheiro nem para editar e nem para entrar com projetos na Lei Rouanet ou na FCC. Concursos de poemas no Brasil e no exterior, desisti.... Trabalhos com Oficinas Poéticas apareceram, mas não garantem minha sobrevivência.
Curriculum para jornais, revistas, escolas e cursinhos foram enviados, mas falta o “quem me indique”. Para fazer produção cultural, tenho de ter estrutura econômica e operacional... tentei várias vezes formar grupos para atuar nesta área, ou como um mutirão poético. Não funcionou.

Acho que ou existe algo errado em minha atitude, ou há medo, inveja, ciúme pela ousadia de minhas atitudes de vida e poesia.
Bem... sem dinheiro e sem perspectiva fui colocado para fora da casa da mulher com que morava e não amava. Meus móveis, textos, documentos e a maioria de minhas roupas foram despachados para um guarda-móveis em Piraquara. Inclusive meu computador, onde está o registro de todo o meu trabalho poético, musical, trabalhos em revista, contos crônicas, etc... Estava trabalhado com produções de evento em bares e restaurante daqui de Curitiba. Mas como trabalhar sem ter onde morar e o que comer?
Dormi vários dias na rua, roubaram-me os registros que fiz em estúdio em São Paulo, Curitiba, Shows, Recitais, até meu irmão se prontificar a me resgatar desta situação. Ele pode ria me abrigar, mas tem família, seus problemas e nunca concordou com minha opção de vida: a poesia. Somos ideologicamente avessos. Nosso convívio não daria certo.
Não tenho para onde ir...
Então a solução encontrada, quando eu estava em estado de choque, bêbado, traumatizado, foi me internar numa instituição de recuperação de alcoólatras. Topei, pois não tinha para quem mais recorrer. Meus amigos moram com pais e mães, ou têm suas vidas conjugais e familiares organizadas e não estariam dispostos a colocar um elemento estranho, muito estranho, dentro de suas casas.
Só me restou essa instituição... Topei e achei legal me tratar.
Me informei como era a rotina e as terapias desta Instituição: Acordar, rezar, lavar banheiro, cuidar do pátio e da cozinha, rezar a tarde, de noite. Perguntei ao pastor da instituição quais eram as atividades físicas, intelectuais, e se poderia levar livros, meus poemas, fazer música.
Bem, os livros e os meus textos só entrariam na Instituição depois de uma avaliação ideológica, religiosa de acordo com as crenças destes. A música só se tiver temática evangélica. Outro tipo de música, não! Perguntei se poderia escrever, eles disseram que só se o pastor liberasse o caderno e a caneta. E mais, que eu apenas teria duas horas por dia para ler e escrever. Ou seja: Censura e discriminação... e ainda, em seus discursos, pregam respeitar as diferenças. Hilário, não?
Sei que não é este o lugar para uma terapia.
Cara, se eu ficar muito tempo lá eu vou pirar ou morrer...
Por isso, estou te pedindo ajuda. Faça um movimento para me tirar de lá o mais breve possível. Fale com poetas, escritores e pessoas influentes. Preciso de um trabalho, casa para morar e comida. Mal ou bem , sou um patrimônio da literatura de Curitiba. Por favor, me ajude.
Obrigado!
Jorge".
Mais informações e sobre o trabalho genial de Jorge Barbosa Filho em:

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